A situação crítica dos reservatórios das hidrelétricas já repercute negativamente nos negócios do mercado livre - ambiente onde as empresas compram energia diretamente dos geradores sem a intermediação das distribuidoras, como ocorre com os consumidores residenciais.
Desde o início do mês, o preço da energia no mercado à vista, chamado de PLD, está no valor máximo de R$ 822,23 o megawatt hora (MWh). Esse preço varia conforme as condições de geração e baliza o preço dos contratos feitos pelos consumidores do mercado livre. Se o regime de chuvas está ruim, mais térmicas são acionadas e o preço sobe. Se os reservatórios estão cheios, ele cai. Foi o que ocorreu no início de ano, com as chuvas abaixo das previsões.
A alta do PLD tem feito as grandes indústrias repensarem as estratégias para o ano. Algumas fazem contas para ver se vale a pena reduzir o consumo para lucrar com a venda do excedente da energia, enquanto outras buscam maneiras de ajustar a produção ao volume de energia contratada, para evitar penalidades e adquirir energia no mercado à vista (pelo preço de R$ 822 o Mwh).
O diretor comercial da comercializadora Bolt Energias, Rodolfo Salazar, diz que, pelo menos, três clientes da empresa no setor têxtil avaliam diminuir ou até parar a produção. "As margens do setor são baixas, e, com a alta do PLD, é como se pagassem para fabricar os produtos." Dois dos consumidores avaliam parar as fábricas para não ficarem expostos ao mercado à vista, enquanto um deles, 100% contratado, planeja lucrar com o preço alto, disse.
Quem ainda não tem contratos de energia e precisa fechar negócios nos próximos meses também tem sentido os efeitos da seca. Hoje contratos de compra e venda de energia para 2014 estão sendo negociados por cerca de R$ 400 o MWh - reflexo do PLD de R$ 822,23.
No fim do ano passado, quando o nível dos reservatórios apresentava trajetória crescente e a previsão de chuvas para janeiro era bastante favorável, era possível contratar energia para entrega em 2014 pagando entre R$ 160 o MWh e R$ 170 o MWh. "O mercado não tinha a expectativa de que o sistema passaria por tal estresse e que janeiro seria seco", disse o sócio-diretor da comercializadora Ecom Energia, Paulo Toledo.
No início de janeiro, o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) trabalhava com a projeção de que as chuvas do mês seriam de 98% da média histórica no sistema Sudeste/Centro-Oeste. Mas a atuação de uma massa de ar quente e seca nas Regiões Sul, Centro-Oeste e Sudeste impediu o avanço de frentes frias, provocando seca e temperatura elevada. Por isso, o volume de chuva real para janeiro ficou bem abaixo do previsto, em 54% da média histórica.
A combinação de chuvas escassas e consumo alto levaram ao esvaziamento dos reservatórios das principais hidrelétricas do País. Hoje, as represas das usinas do Sudeste/Centro-Oeste estão no nível mais baixo desde 2001, ano em que o governo decretou racionamento.
A situação não deve melhorar este mês, porque as chuvas devem ser fracas, próximas a 42% da média histórica. Salazar afirmou que a liquidez do mercado livre para operações no curto prazo não foi comprometida. "O agente descontratado, seja gerador, consumidor ou comercializador, continua comprando energia."
O desaquecimento dos negócios foi sentido na busca por contratos de médio e longo prazos. O presidente da Comerc, Cristopher Vlavianos, diz que a energia para 2015 já está sendo vendida entre R$ 180 o MWh e R$ 200 o MWh. Antes crise, os preços estavam entre R$ 135 o MWh e R$ 140 o MWh.