A evolução de 0,2% do PIB no início do ano, com queda de 0,8% da indústria, retração do consumo das famílias de 0,1%, além do desempenho dos investimentos (-2,1%), aliada a outros dados do mercado, gera expectativas pessimistas entre analistas. Eles reforçam que as chances do PIB ficar negativo nos próximos trimestres são grandes, o que poderia levar a uma recessão técnica (queda em dois trimestres consecutivos). Soma-se a isso o fato do desempenho ter caído 0,3% no terceiro trimestre de 2013, subido 0,4% no último e agora ter crescido apenas 0,2%.
Pesquisa PMI da Markit/HSBC para maio confirmou que as coisas podem piorar, levando em conta outras mínimas de maio. O resultado do PIB do segundo trimestre será divulgado no dia 29 de agosto, a 36 dias do primeiro turno das eleições presidenciais. Paulo Gala, estrategista da Fator Corretora, acredita que se alguma recuperação não vier a partir de julho, podemos ter uma recessão técnica na véspera da eleição. Em conversa com o JB por telefone, ele reforçou que é muito difícil que o Brasil escape de uma recessão em 2014. Para ele, está mais ou menos claro que o PIB no segundo trimestre será negativo, o que pode causar uma reavaliação do resultado do primeiro trimestre, além da grande possibilidade de queda no terceiro.
"É muito difícil escapar da recessão. Todos os indicadores de confiança têm a mínima desde 2008 e 2009, além de dados com queda relevante, na produção industrial, produção de veículos. Indicadores também mostraram queda em abril e maio, e junho deve ser um mês recessivo com a Copa do Mundo. Considerando tudo isso, não vamos escapar de uma recessão", acredita Gala.
Gala destaca que esse cenário já estava no radar da corretora há um mês. O ciclo de crescimento que estava chegando ao fim, "chegou ao fim de vez", marcando o final de mais ou menos uma década de crescimento, com expansão do consumo, no crédito e no investimento. "A economia é um pouco assim mesmo, é cíclica, tem começo, meio e fim e a gente chegou ao final, que coincidiu com a época da eleição, com vários problemas na área fiscal, defasagem de preços, como na gasolina e energia elétrica, contas externas, e 'por aí vai'", pondera Gala.
O ex-presidente do BNDES, Luiz Carlos Mendonça de Barros, em entrevista ao Valor Econômico no início do mês, ressaltou que todos os elementos de crescimento que prevaleceram nos últimos 15 anos não existem mais. Para ele não há crise, mas, sim, falta de investimento. Disse, no entanto, que a situação da economia brasileira é "muito superior à do passado".
O ex-diretor do Banco Central, Luiz Fernando Figueiredo, da Mauá Sekular Investimentos, por sua vez, declarou à coluna de Claudia Safatle no Valor que já estamos em recessão, já que uma contração no PIB igual ou superior a 0,2% do segundo trimestre deve provocar um ajuste pelo IBGE nos dados do primeiro, que passaria para um PIB negativo - o que caracterizaria uma recessão técnica.
Marcel Grillo Balassiano, da área de Economia Aplicada do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da FGV, reforça que, para o segundo trimestre deste ano, as previsões não são nada animadoras, devido ao cenário mais pessimista no setor de serviços, em função do comércio e de serviços da informação. A indústria também deve recuar mais, motivada pela indústria de transformação e da construção civil. O índice de confiança da indústria da FGV recuou 5,1% em maio, em relação ao mês anterior.
"Os índices da situação atual e das expectativas também caíram bastante (5,1% e 5,0%, respectivamente). Um dos motivos da queda da construção civil é a desaceleração do crédito imobiliário. A Copa do Mundo também deve afetar negativamente a produção, em função da diminuição da jornada de trabalho por causa dos jogos", explicou Balassiano ao JB.
Pelo lado da demanda, continua o especialista, o consumo das famílias também apresenta sinais de desaceleração, que pode não ser inferior à registrada no primeiro trimestre, mas que deve apresentar um baixo crescimento devido ao fim do incentivo ao consumo e menor oferta de crédito. Deve ser, contudo, a principal contribuição para o crescimento do PIB, aponta Balassiano.
Os investimentos, por sua vez, ainda de acordo com Balassiano, devem fechar o ano no negativo, em função, entre outros fatores, da queda de confiança dos empresários. O índice de confiança empresarial, calculado pela FGV, caiu 4,9% em maio, o maior recuo desde o final de 2008. Os índices da situação atual e das expectativas também caíram 3,9% e 4,9%, respectivamente, e o índice de confiança do consumidor vem recuando - em maio, caiu 3,3%. O menor crescimento dos empréstimos do BNDES, explica, também tem influência no cenário de investimentos.
"Com isso, as projeções, que já eram baixas, estão sendo revisadas para baixo. O último boletim Focus projetou crescimento de 1,5% para 2014 e 1,9% para 2015." Balassiano destaca o desempenho do país em 2013, quando cresceu 2,3%, abaixo dos 3% do mundo, dos 4,7% dos países emergentes e 2,7% da América Latina.
Um dos principais entraves ao crescimento, acredita, é o investimento baixo. A média da taxa de investimento brasileira entre 2004 e 2013 foi de 18,3% do PIB, também abaixo da taxa mundial (23,8%), da América Latina (21,1%) e dos países emergentes (29,9%), alerta. Países vizinhos latino-americanos também apresentaram taxas maiores do que o Brasil no período, como Peru (23,1%), México (22,9%), Chile e Colômbia (ambos com 22,5%).
"Então, a chamada 'nova matriz econômica' do governo Dilma resultou num crescimento baixo, inflação alta, déficit em transações correntes e numa política fiscal associada a 'contabilidade criativa'. No ano que vem, independentemente de quem ganhar as eleições presidenciais, terá que fazer um forte ajuste para o país ter condições de aumentar a taxas de investimentos, e consequentemente melhorar o crescimento; fazer com que a inflação volte para a meta; melhora da política fiscal, entre outros", diz Balassiano.
Os problemas econômicos do Brasil, explica, são conjunturais e estruturais. O Custo Brasil, que é um conjunto de dificuldades estruturais, burocráticas e econômicas que encarecem o investimento no Brasil, como explica Balassiano, compromete a competitividade e a eficiência da indústria. Problemas como alta carga tributária, dificuldade para se abrir um negócio, altos custos trabalhistas, burocracia para importação e exportação também dificultam o investimento.
"O impacto de uma recessão, que eu acho pouco provável para esse ano, seria muito ruim, mas mesmo que não haja recessão, esse crescimento medíocre que o Brasil vem passando nos últimos anos é uma questão fundamental para ser atacada pelo próximo governo, inclusive porque esse crescimento baixo está acompanhado de uma inflação alta", indica Balassiano.
Felipe Salto, economista da Tendências Consultoria, explica que se crescemos tão pouco e chegamos ao ponto de discutir uma recessão em 2014, é porque o governo tomou medidas erradas ao longo do tempo, negligenciando a necessidade de aumentar a poupança doméstica, quando a fonte externa secou, com balança de pagamentos negativa, baixa poupança, baixa produtividade e investimentos em infraestrutura.
A consultoria, no entanto, ainda mantém projeção de crescimento 1,3% neste ano, e de 0,2% no segundo trimestre de 2014, levando em conta que o governo ainda tem alguns instrumentos a mão. "A renda do Brasil é um quarto da renda dos desenvolvidos. Por isso crescer pouco é um problema tão sério."